Equidade, diversidade e nosso futuro: Entrevista com Liel Miranda, CEO da Alpargatas.

20 de novembro, 2024 | Escrito por MEX

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A Alpargatas, famosa pelas sandálias Havaianas, foi destaque no encontro de novembro do MEX, quando as executivas conheceram o seu novo CEO, Liel Miranda. Com formação em Administração, e vasta experiência em gestão tendo atuado em países como Brasil, China, Canadá e Inglaterra. Em 2024, Liel assumiu a Alpargatas com o compromisso de fortalecer a competitividade da marca e avançar em sua jornada sustentável. Acompanhe nossa conversa para descobrir sua visão abrangente sobre o mundo dos negócios, liderança e diversidade!

MEX BRASIL – Dada sua experiência em multinacionais e agora à frente de uma grande empresa brasileira, quais são os desafios únicos e oportunidades que você encontrou em cada contexto?

Liel Miranda – Eu vejo uma grande vantagem no Brasil na nossa habilidade de improvisar e na capacidade criativa, além da resiliência em enfrentar constantes mudanças. A flexibilidade e resiliência dos brasileiros são características bastante evidentes. Outra distinção marcante é a nossa abertura cultural; somos um povo com poucas barreiras. Pessoas de diversas nacionalidades acabam se tornando brasileiras quando vivem aqui, e essa miscigenação cultural é muito forte no Brasil. Essas são, a meu ver, algumas das qualidades mais notáveis do país. Quando penso no exterior, percebo contrastes claros, por exemplo, a Inglaterra se destaca pela sua tradição, onde tudo é organizado e bem definido a partir de uma herança cultural sólida. Já na China, a grande vantagem é o foco intenso no desenvolvimento pessoal, econômico e profissional. A disciplina e determinação chinesas são impressionantes e justificam o crescimento acelerado do país. O Canadá, por sua vez, é uma sociedade marcada pelo igualitarismo. A população vive em condições de igualdade, tanto econômica quanto social, resultando em uma sociedade mais homogênea. Aprendi a admirar essas diferenças e qualidades distintas de cada lugar.

MEX BRASIL -Em nosso encontro, você mencionou que o consumidor é o verdadeiro “chefe”. Como essa visão influenciou suas decisões estratégicas?

Liel Miranda – Entender que o consumidor é o verdadeiro chefe muda completamente a forma como inovamos. Nas empresas em que trabalhei, a inovação sempre teve um papel fundamental. No entanto, essa inovação não deve surgir apenas porque temos a tecnologia, o produto ou a ideia. Ela precisa existir para resolver um problema ou atender a uma necessidade do consumidor, ou até mesmo criar uma nova demanda em suas vidas. Quando adotamos essa perspectiva, a inovação passa a ser impulsionada de fora para dentro, ao invés de ser motivada internamente. Não se trata de adquirir uma nova máquina ou desenvolver uma fórmula inédita, mas sim de compreender o que realmente beneficiará os consumidores ou despertará neles uma nova necessidade. Um bom exemplo disso é a Havaianas, que transformou seu design, evoluindo de chinelos tradicionais para modelos coloridos, conquistando assim o mercado da moda com inovação.

MEX BRASIL – Você mencionou a diversidade como essencial para o sucesso organizacional. Como a inclusão de diferentes perspectivas culturais influenciam positivamente uma decisão estratégica?

 Liel Miranda – Quando reunimos pessoas de diferentes origens e elas apresentam desempenhos excelentes, desmistificamos a ideia de que talento está ligado a gênero, cor ou perfil específico, nós crescemos. Acredito que o primeiro passo para criar essa cultura dentro das organizações é continuar apresentando evidências. Diversas pesquisas, como as da McKinsey e da Bain, demonstram que empresas e equipes mais diversas alcançam maior sucesso. Pude viver isso na prática, quando liderei equipes na China, Canadá e Inglaterra.

Compreendi que as diferenças culturais, o desenvolvimento de talentos e as parcerias estratégicas são fundamentais para aumentar o potencial de inovação de uma empresa. Times diversos e colaborativos são mais efetivos. Acredito que pessoas com outros repertórios e olhares diferentes estimulam a resiliência e a inovação das operações, garantindo mais potencial de criação e a formação de uma mentalidade disruptiva dentro das empresas. A população brasileira é complexa e carrega consigo suas peculiaridades, lutas e capacidade de pensar sob ângulos diversos, o que beneficia os negócios.

A minha trajetória e experiência me mostrou que ser comprometido com a causa racial é algo fundamental. Isso me levou a ser um dos fundadores do Movimento pela Equidade Racial (MOVER), formado por mais de 50 empresas, que buscam dar mais oportunidades para grupos sub-representados no mundo corporativo. E tem como objetivo tornar as organizações mais competitivas, estimulando a resiliência, inovação, trazendo representatividade em relação aos próprios consumidores e à sociedade.

MEX BRASIL – Como você enxerga o papel das lideranças na promoção de políticas de diversidade nas organizações?

Liel Miranda – Na minha opinião é essencial implementar regras claras, pois deixar o processo sem orientação não funciona. Se a empresa realmente valoriza a diversidade, deve definir mecanismos para garantir resultados. Apenas discutir o assunto sem ações concretas torna menos provável que mudanças ocorram. Na Alpargatas, por exemplo, temos foco em pessoas, buscando diversidade e inclusão em nosso corpo de colaboradores, remuneração digna e no desenvolvimento local nas regiões em que operamos. E faz parte da nossa estratégia de sustentabilidade garantir que, até 2030, 50% das posições de alta liderança sejam ocupadas por mulheres e 25% de gestão sejam de grupos sub-representados.

MEX BRASIL – Na sua opinião, quais são as barreiras mais significativas que as mulheres enfrentam ao tentar ascender a cargos de liderança?

Liel Miranda – Acredito que um dos desafios enfrentados pelas mulheres é o preconceito, que afeta tanto homens quanto mulheres. Muitas vezes, as mulheres internalizam a ideia de que não estão prontas ou que enfrentarão sacrifícios significativos. Um exemplo claro disso é que nunca me perguntaram como equilibro minha vida pessoal e profissional. Em painéis com CEOs mulheres, essa pergunta é comum: como conciliar a vida pessoal sendo CEO? Sempre me pergunto por que não me fazem essa pergunta, já que também tenho filhos.

As mulheres precisam superar a ideia de que têm mais responsabilidades domésticas ou que não estão preparadas para certas posições por serem jovens. Por exemplo, um homem jovem de 30 anos não hesita em liderar uma equipe mais velha, enquanto uma mulher da mesma idade pode duvidar de sua capacidade. A síndrome da impostora é um desafio que precisa ser superado. As mulheres devem se ver como profissio- nais competentes e preparadas, independentemente da idade ou experiência. É crucial também dividir igualmente as responsabilidades familiares com o parceiro, evitando a crença de que há um peso maior sobre elas no equilíbrio entre carreira e família.

MEX BRASIL – Como você vê o papel dos homens na promoção da igualdade de gênero no local de trabalho, e que ações práticas eles podem adotar para apoiar suas colegas?

Liel Miranda – Não se pode esperar que as mulheres trabalhem das oito da manhã às seis da tarde todos os dias sem considerar o preconceito existente na sociedade. Implementar políticas de trabalho flexíveis, como horários adaptáveis, licenças-maternidade prolongadas e assistência familiar, facilita a ascensão das mulheres a cargos de liderança. Essas medidas ajudam a equilibrar a vida pessoal e profissional, desafio que os homens geralmente não enfrentam, eles assumem os desafios profissionais e pronto, porque a expectativa é que alguém mais cuide dos filhos e da casa. Para as mulheres, a sociedade frequentemente pressupõe que elas devem assumir essas responsabilidades. Se lhes falta flexibilidade no trabalho, torna-se difícil gerenciar ambos os aspectos da vida. Portanto, as empresas devem reavaliar suas práticas e políticas para oferecer essa flexibilidade necessária.

MEX BRASIL – Você tem filhas?

Liel Miranda – Não, só dois meninos.

MEX BRASIL – E como você cria seus filhos para que eles tenham essa visão equitativa?

Liel Miranda – Procuro conscientizá-los sobre os preconceitos presentes na sociedade. Desde cedo, os meninos já chegam da escola com ideias pré- concebidas sobre as meninas. Meu objetivo é, pelo menos, despertar essa consciência: perceber que estão pensando de determinada maneira. Uma vez cientes, eles podem decidir se desejam manter esse modo de pensar. Muitas vezes, esses preconceitos estão tão enraizados que os meninos crescem com eles, sem perceber ou refletir sobre suas origens. Acredito que o mais importante é ajudá-los a desenvolver essa consciência crítica.

MEX BRASIL – E o que nós seremos daqui para frente, quando falamos em equidade?

Liel Miranda – Estou certo de que continuaremos a progredir nessa evolução. A sociedade já está avançando, e a tecnologia desempenha um papel crucial nesse processo. No passado, certas tarefas eram estereotipadas como sendo para mulheres, como professoras e enfermeiras, enquanto outras, como engenheiros e médicos, eram vistas como masculinas. Hoje, essas distinções estão desaparecendo.

A tecnologia nivela o campo de atuação, permitindo que talento, dedicação e esforço determinem o sucesso, independentemente de gênero, etnia ou qualquer outra forma de diversidade. O futuro promete ser mais igualitário. Além disso, os consumidores, especialmente as gerações mais jovens, esperam que as empresas sejam responsáveis com questões ambientais, sociais e de governança (ESG). As empresas não podem mais ignorar essas responsabilidades. Esse ciclo virtuoso, impulsionado pela maior conscientização empresarial, viabilização tecnológica e exigências dos consumidores, continuará a acelerar o progresso para uma sociedade mais justa e igualitária.

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