Não é de hoje que o Grupo Boticário demonstra seu compromisso com causas socioambientais ao investir anualmente 1% de sua receita nesses projetos. Artur Grynbaum, sócio e vice-presidente do Conselho, que falou ao MEX no 1º Fórum de Gestão com CEOS, acredita que essa prática se tornará mais comum devido à crescente pressão da sociedade em relação à atuação ESG. Ele afirma que o tema, atualmente um diferencial, se tornará uma questão de sobrevivência para as empresas do futuro. Confira!
MEX BRASIL – Artur, você tem uma longa trajetória no Grupo Boticário e uma visão clara sobre sustentabilidade. Na sua opinião, quais são os maiores desafios que as empresas enfrentam ao tentar implementar práticas sustentáveis e como você acredita que essas barreiras podem ser superadas?
Artur Grynbaum – Acredito que o primeiro passo é as empresas compreenderem que a sustentabilidade não é algo que desvia de seus objetivos ou tira o foco, mas sim uma parte integrante de suas atividades. Elas precisam entender que a sustentabilidade faz parte da direção do negócio e incorporá-la em suas estratégias. Isso significa que a sustentabilidade não deve ser vista como uma tarefa adicional, mas sim como uma forma de aprimorar e otimizar os processos existentes. Ao integrar a sustentabilidade em suas operações diárias, as empresas podem não apenas contribuir para um futuro mais sustentável, mas também melhorar sua eficiência, reduzir custos e fortalecer sua reputação perante a sociedade. Portanto, é essencial que as organizações abracem a sustentabilidade como parte fundamental de seus negócios e a incorporem em todas as suas atividades.
MEX BRASIL – Você mencionou que a sustentabilidade deve ser parte integral do modelo de negócios. Pessoalmente, como você vê a relação entre práticas sustentáveis e a longevidade das empresas? Acredita que a sustentabilidade é um fator determinante para o sucesso a longo prazo?
Artur Grynbaum – De fato, vejo a questão da sustentabilidade como parte integral do modelo de negócios. No nosso caso, nós incorporamos isso no nosso jeito de ser. Algumas empresas ainda estão longe dessa realidade e fazem isso através de atividades mais isoladas, seja um plantio de árvores, uma ação social ou uma destinação de renda ou lucro de produto voltado para isso. Tudo funciona, mas nós vemos de uma forma mais completa e duradoura, que é justamente essa incorporação do modelo de negócio sustentável a outras atividades de planejamento e tudo mais que temos. Se eu vejo isso como uma questão de prazo? Sim, porque para nós, sustentabilidade, ESG ou, como brinco, a “sopa de letrinhas”, no fundo, o nosso pensamento está muito atrelado a ‘fazer o que é certo’. Acredito que, fazendo o que é certo, temos mais chances de sermos mais longevos e chegarmos mais longe. Ao fazer o que é certo, não apenas para o negócio, mas também para a sociedade e o meio ambiente, estamos construindo um legado duradouro.
MEX BRASIL – Considerando sua trajetória pessoal e profissional, quais experiências ou influências moldaram sua visão sobre sustentabilidade? Como essas experiências impactam suas decisões e estratégias no Grupo Boticário?
Artur Grynbaum – Posso compartilhar algumas situações que me marcaram. Uma vez, enquanto andava pela fábrica, encontrei alguns funcionários e comentei sobre um tema relacionado à questão ambiental e ecoeficiência. Para minha surpresa, um deles disse: “Nossa, imagina, não precisa fazer isso, porque a gente já tem uma fundação”. Essa resposta me fez perceber que algumas pessoas entendiam erroneamente que, por termos uma fundação realizando ações sustentáveis, estávamos liberados de fazer o mesmo internamente. Não funciona dessa maneira.
Outra situação semelhante ocorreu com alguns franqueados. Eles me diziam: “Nossa, eu já faço muita coisa, porque escolhi uma marca que se preocupa com todos esses dados, detalhes e ações. Então, eu não preciso fazer isso aqui”. Novamente, não é bem assim. Todos nós somos líderes e temos impacto nas regiões em que atuamos. Não basta apenas contar com o que a marca faz, é preciso reproduzir essas ações localmente. Houve também um momento de reflexão durante uma viagem. Percebi que as atividades realizadas, como ações isoladas, são boas, mas deveriam estar correlacionadas com os resultados do negócio para que as pessoas tivessem o entendimento correto.
Essas experiências me mostraram que para alcançarmos um resultado de fato, a sustentabilidade não pode ser tratada como algo pontual ou isolado, mas deve estar integrada em todas as áreas e níveis da empresa, desde a produção até a atuação dos franqueados e colaboradores. Ser comunicada, compreendida e promover o engajamento. Somente assim poderemos realmente fazer a diferença e gerar um impacto positivo em toda a nossa cadeia de valor.
“O tema ainda se constitui como diferencial, mas se tornará uma questão de sobrevivência para as empresas. As gerações mais novas, além de nativas digitais, são nativas do ESG. Cada vez mais os consumidores estão se perguntando sobre o trabalho das empresas na sociedade.”
MEX BRASIL – Em sua opinião, quais são os maiores desafios que as empresas enfrentam ao tentar implementar práticas sustentáveis? Como você acredita que o Grupo Boticário tem superado esses desafios e o que ainda precisa ser feito?
Artur Grynbaum – Um dos principais desafios é a comunicação e o entendimento dos colaboradores. Quando falamos de sustentabilidade, não estamos nos referindo a abraçar árvores, mas sim a atividades concretas que trazem soluções e benefícios para a sociedade e para os próprios colaboradores. No Grupo Boticário temos superado esse desafio ao trazer, ao longo do tempo, uma linguagem mais voltada para os negócios.
Por exemplo, quando vamos desenhar um novo modelo de loja, já está claro para a equipe responsável que é necessário tratar todos os materiais que estão sendo retirados, como reciclá-los, utilizar madeira certificada e garantir a ecoeficiência em todas as etapas. É importante lembrar que isso não é uma atividade adicional, mas sim a maneira como fazemos as coisas. Conseguimos inserir a sustentabilidade dentro da linguagem dos negócios e do modelo de negócio, o que considero um grande trunfo para nós.
MEX BRASIL – Você acredita que os consumidores estão realmente dispostos a apoiar empresas que investem em sustentabilidade, mesmo que isso signifique pagar um pouco mais pelos produtos?
Artur Grynbaum – Durante muito tempo, várias pesquisas que realizamos mostravam que as pessoas eram simpáticas ao tema da sustentabilidade, mas bastava uma diferença de 10 centavos para que deixassem de comprar um produto que fazia coisas bacanas em prol de outro mais barato. Isso acontecia até mesmo com consumidores de outros países. No entanto, a sustentabilidade sempre ocupou uma questão de reputação para as empresas. Hoje, principalmente com a chegada da geração Z, percebemos um olhar muito mais atento para esse tema. Não só eles, mas a sociedade como um todo cobra das empresas a obrigação de fazer a coisa certa.
Estamos percebendo que, em alguns casos, os consumidores estão dispostos a pagar um pouco mais para escolher empresas que têm uma atuação diferenciada. Ainda é uma base pequena, mas é um movimento gradual, que já está em curso e deve se intensificar nos próximos anos.
MEX BRASIL – E, finalmente, Artur como você vê o futuro da sustentabilidade no setor de cosméticos e perfumaria?
Artur Grynbaum – A pergunta certa é se há diferencial no setor de cosméticos, no futuro da sustentabilidade. No fundo, o setor de cosméticos é um dos mais atuantes no aspecto da sustentabilidade. Se observarmos os rankings e premiações de empresas sustentáveis, três a quatro companhias do setor de cosméticos sempre se destacam. Isso se deve, em grande parte, ao processo de inovação bastante importante no setor. No Grupo Boticário, por exemplo, inovamos em vários aspectos, incluindo a sustentabilidade. Temos tendências de utilização significativa de materiais pós-consumo, tanto no plástico quanto em cartonagem e vidro, que sempre foi mais desafiador. Hoje, 30% dos frascos do Malbec são feitos de vidro reciclável, o que demonstra nosso compromisso com a economia circular.
Além disso, temos buscado a diminuição de materiais desnecessários nas embalagens, como plásticos que antes achávamos essenciais. Conseguimos reduzir as gramaturas e massas utilizadas, sem prejuízo para o consumidor final. Mantemos a aparência e o lastro (peso), mas alcançamos uma economia importante na utilização dos materiais. Novos processos também estão sendo implementados constantemente para melhorar a eficiência energética, resultando em menor consumo de energia. Nas fábricas e centros de distribuição, temos investido em energias alternativas, como a solar. Nos fretes, buscamos a substituição de combustíveis fósseis por meio da eletrificação e do uso de veículos híbridos em parceria com transportadores.
Por fim, medidas de ecoeficiência são amplamente divulgadas e buscadas pelas empresas com melhor desempenho no setor, especialmente no que diz respeito ao uso consciente da água, um recurso essencial para a indústria de cosméticos.
“Se observarmos os rankings e premiações de empresas sustentáveis, três a quatro companhias do setor de cosméticos sempre se destacam. Isso se deve, em grande parte, ao processo de inovação bastante importante no setor. No Grupo Boticário, por exemplo, inovamos em vários aspectos, incluindo a sustentabilidade.”